Orientação sexual, uso do tempo e mercado de trabalho – 09/07/2024 – Lorena Hakak

O matemático e cientista inglês Alan Turing foi um dos responsáveis por decifrar o código de comunicação nazista Enigma durante a Segunda Guerra Mundial. Essa descoberta permitiu que os aliados acessassem informações sigilosas que, provavelmente, aceleraram o fim da guerra e salvaram muitas vidas.

Porém, suas realizações não foram suficientes para o proteger de perseguições devido a um suposto “problema”. Ele era homossexual, o que na época era considerado um crime.

Em 1952, Turing foi condenado pelo crime de indecência grave e submetido à castração química como alternativa à prisão. Ele cometeu suicídio em 1954. Somente em 2013 a rainha lhe concedeu um perdão póstumo. Sua história foi retratada no filme O Jogo da Imitação de 2014.

Esta é somente uma entre milhares de histórias que ilustram como a humanidade tem dificuldade em lidar com as diferenças. Eu tenho uma certa dificuldade em entender por que diferentes formas de amor incomodam tanto algumas pessoas. Ainda hoje, em alguns países como Irã, Arábia Saudita e Nigéria, a homossexualidade é considerada crime e pode ser punida com a pena de morte.

A homossexualidade deixou o rol de “doença” pela Organização Mundial da Saúde apenas em 1990. No Brasil essa medida foi tomada em 1985 pelo Conselho Federal de Medicina. Anualmente, diversas paradas LGBT+ acontecem pelo mundo, celebrando a diversidade e a importância de aceitarmos o outro do jeito que é. Para mim, acima de tudo, é a festa da aceitação e do respeito mútuo.

No Brasil, não existem muitas pesquisas demográficas que incluam orientação sexual no rol de perguntas a serem feitas aos participantes. Em 2019, tivemos essa inclusão na Pesquisa Nacional de Saúde. Os indivíduos tinham como opção de resposta dizerem se se identificavam como heterossexual, homossexual, bissexual ou outra orientação. O percentual de respondentes que se identificavam como não heterossexual ficou próximo de 2%. Essa pesquisa permitiu analisar se a orientação sexual de pessoas casadas ou solteiras (ou em outro estado civil) condiciona diferentes decisões no uso do tempo, mais especificamente na decisão de alocação de horas entre o mercado de trabalho e cuidados.

De acordo com o artigo “Latin American pride: Labor market outcomes of sexual minorities in Brazil” (“Orgulho Latino Americano: os desfechos de minorias sexuais no mercado de trabalho no Brasil”, em tradução livre) de João Tampellini, mulheres que se autodeclaram lésbicas têm maior nível de escolaridade, maior probabilidade de estarem trabalhando, inclusive em tempo integral, em comparação com mulheres heterossexuais.

Além disso, o autor aponta que mulheres lésbicas ganham, em média, mais. Por outro lado, homens gays ou bissexuais têm menor probabilidade de trabalhar em tempo integral em comparação com homens heterossexuais. O autor não observou diferença salarial entre homens gays ou bissexuais e heterossexuais.

Com relação à divisão do trabalho doméstico, há uma diferença entre homens e mulheres dependendo da orientação sexual. Na nota técnica de 2020, “Rendimentos e jornadas de trabalho remunerado e não remunerado no Brasil: uma análise por orientação sexual”, os autores Ana Luiza Barbosa, Carolina Vital, Felipe Russo e Joana Costa utilizam dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua para explorar diferenças na divisão do trabalho doméstico entre homens gays e heterossexuais.

Os resultados indicam que os homens gays alocam, em média, 14 horas por semana aos afazeres domésticos, enquanto os homens heterossexuais dedicam cerca de 11 horas.

Já no caso das mulheres, as diferenças são mais acentuadas: as mulheres heterossexuais alocam, em média, 7 horas a mais nos afazeres (24 horas por semana) do que as mulheres lésbicas. Além disso, mulheres heterossexuais passam cerca de 3 horas a menos no mercado de trabalho semanalmente. A taxa de participação das mulheres lésbicas no mercado de trabalho é quase 30 pontos percentuais superior à das mulheres heterossexuais.

Em resumo, os resultados indicam que homens gays dedicam mais tempo aos afazeres domésticos em comparação aos homens heterossexuais, enquanto mulheres lésbicas dedicam menos tempo a essas tarefas e mais ao trabalho remunerado do que as mulheres heterossexuais.

Essa distribuição de tempo reflete como as normas de gênero influenciam tanto o tempo alocado para as responsabilidades domésticas quanto na participação no mercado de trabalho, sendo que, em relações heterossexuais, essas normas podem ser especialmente rígidas e mais desiguais

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