Senado analisa Proposta de Emenda à Constituição em um momento de ataques de Lula à chefia do BC e à autonomia operacional do órgão. Texto pode ser votado na semana que vem. Fachada do Banco Central do Brasil em Brasília
Marcello Casal/Agência Brasil
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado adiou a votação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que amplia a autonomia e transforma o Banco Central – atualmente uma autarquia de natureza especial vinculada ao governo – em uma empresa pública (leia mais aqui).
A PEC estava na pauta da CCJ nesta quarta-feira (3). Após o relator da proposta, senador Plínio Valério (PSDB-AM) ler seu relatório favorável à PEC, com a apresentação de uma nova versão do texto, foi concedida vista coletiva, ou seja, mais tempo para os senadores analisarem a proposta.
A previsão é que a PEC retorne à pauta na semana que vem. Governistas queriam um adiamento por prazo maior. Se for aprovada pela CCJ, ainda terá de passar pelo plenário principal do Senado.
De acordo com defensores da proposta, o objetivo do texto é assegurar “autonomia orçamentária e financeira”, complementando a lei de 2021 que conferiu autonomia operacional à instituição.
A proposta foi protocolada no Senado em novembro do ano passado. O texto foi assinado por 42 senadores e tem como primeiro signatário o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO).
Entenda os motivos da alta do dólar
A PEC que amplia a autonomia do Banco Central é discutida no Senado no contexto de uma série de ataques do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao presidente do BC, Roberto Campos Neto, que foi indicado para o cargo por Jair Bolsonaro (PL). O mandato de Campos Neto termina no final deste ano.
Desde que assumiu o terceiro mandato, Lula tem externado insatisfações com o patamar da taxa básica de juros da economia brasileira. A Selic é fixada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central e, atualmente, está em 10,5% ao ano.
Para Lula, o atual cenário da economia brasileira, com inflação dentro da meta, permite uma taxa de juros menor, o que, na visão do presidente, facilitaria a realização de investimentos no país.
O petista também tem feito críticas à lei da autonomia operacional do BC, aprovada em 2021 pelo Congresso Nacional.
A legislação estabeleceu que os presidentes da instituição terão mandatos de quatro anos e não coincidentes com os mandatos do presidente da República. Por isso, os primeiros dois anos deste governo Lula tiveram o Banco Central presidido por um indicado por Bolsonaro.
As ofensivas de Lula sobre o Banco Central e as falas dele sobre aumento de gastos têm gerado instabilidade no mercado financeiro e são apontadas com razões para a alta do dólar no país.
O que diz a PEC
A proposta insere na Constituição um dispositivo que assegura ao Banco Central autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira.
Com a autonomia orçamentária, o BC pode elaborar, aprovar e executar o próprio orçamento de forma independente do governo. Mas, ainda assim, ainda terá que prestar contas ao Congresso Nacional.
Já com a autonomia financeira o banco poderá utilizar receitas próprias – geradas pelos seus ativos – para custear despesas com pessoal, com custeio em geral, investimentos e outras.
A proposta ainda altera na Constituição o regime jurídico do Banco Central que deixa de ser uma autarquia de natureza especial vinculada ao governo federal e passa a ser uma empresa pública que exerce atividade estatal. O texto também retira a vinculação com o Ministério da Fazenda ou qualquer órgão da Administração Pública.
Outra questão trazida pela PEC é relativa aos servidores do Banco Central. A proposta estabelece uma mudança no regime dos servidores que deixariam de ser regidos pelas normas do regime jurídico único (RJU) para serem empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Em relação à aposentadoria, o relator acrescentou dispositivos que estabelecem uma paridade de remuneração de aposentados e pensionistas do Banco Central com os atuais quadros do BC.
Relator critica Lula
Após a leitura do relatório, o senador Plínio Valério fez críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em relação a sua posição em relação ao Banco Central.
“Essa discussão que deveria ser uma discussão de Estado está se tornando em picuinha entre o presidente do Banco Central e o presidente Lula, que não cansa de prejudicar o país”, disse o senador.
Mercado é ‘quem quer o BC autônomo’, diz Lula
Dólar atinge maior cotação em mais de dois anos: R$ 5,65
Na última segunda-feira (3), Lula afirmou em uma entrevista que “quem quer o BC autônomo é o mercado”. Após a entrevista, a cotação do dólar subiu e atingiu o maior valor em 2 anos e meio, custando R$ 5,65.
Nesta quarta-feira (3), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se reuniu com Lula no Palácio da Alvorada para tratar da situação cambial e de cortes de gastos no país. Segundo interlocutores do Ministério da Fazenda, a tendência é que Haddad passe o dia em reuniões internas e eventos no Palácio do Planalto.
Ao longo do dia, devem ser discutidas saídas para o momento atual da economia, marcado por fortes tensões entre governo e mercado.