Convencionou-se celebrar o aniversário do Plano Real em 1º de julho, data da introdução da moeda há 30 anos. Há outras datas cruciais para o programa de estabilização, porém.
Naquele mesmo 1994, foi lançada em 1º de março a URV, o indexador destinado a promover uma convergência geral de preços e salários a uma mesma unidade de conta; na mesma data o Congresso promulgou emenda constitucional para conter o déficit no Orçamento.
Em 15 de abril, concluiu-se a renegociação da dívida externa, espécie de gêmea não idêntica da superinflação brasileira –ambas se multiplicaram na década perdida de 1980.
O Plano Real, como se nota, foi uma obra não apenas econômica, mas também política e jurídica. Consumiu o esforço de dezenas de pessoas, antes e depois de vir à luz.
Seis delas estão destacadas abaixo, sem incluir nomes como Rubens Ricupero, Winston Fritsch, Clóvis Carvalho, Pedro Parente, Francisco Lopes, Gustavo Loyola, José Roberto Mendonça de Barros, Armínio Fraga e Everardo Maciel, todos importantes na concepção ou na gestão do programa.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Chegou a ministro da Fazenda quase por acaso –foi a quarta escolha do turbulento Itamar Franco para o posto em apenas oito meses. Aproveitou a oportunidade para uma reviravolta em sua trajetória política –que transformaria também seu partido e o país.
Sociólogo cuja obra era referência para a esquerda nacional, eleito senador e um dos fundadores do PSDB, reuniu em torno de si economistas de orientação liberal egressos do Plano Cruzado (1986) e da PUC-RJ.
Seu principal papel foi político. Era preciso resistir às pressões do Planalto por medidas como congelamento de preços e reajustes salariais, negociar com o Congresso e, não menos importante, ganhar o apoio e a confiança da opinião pública após uma série de pacotes frustrados em anos anteriores.
Sua principal inovação foi abandonar a terapia de choque. Anunciou com antecedência as etapas para o lançamento do real, respeitou os contratos e deu tempo para que consumidores e empresários se preparassem para a reforma monetária.
Eleito presidente, demorou a fazer os ajustes necessários e impopulares no plano. O câmbio flutuante e os superávits fiscais ficaram para o segundo mandato, que conquistou graças a uma mudança na regra constitucional.
PERSIO ARIDA E ANDRÉ LARA RESENDE
Em 1984, os dois economistas da PUC-RJ, que então contavam pouco mais de 30 anos, publicaram a célebre e heterodoxa proposta que embasaria os planos Cruzado e Real, fora outras iniciativas intermediárias.
Batizado de Larida, o documento previa a convivência temporária de duas moedas para eliminar os efeitos da indexação sobre os preços.
Dez anos depois, a ideia inovadora seria combinada a preocupações mais ortodoxas com solidez fiscal, rigor nos juros, reservas em dólar, amparo político e solidez jurídica.
Ambos saíram do governo FHC em circunstâncias rumorosas. Arida deixou a presidência do Banco Central em 1995, após passar um feriado com um banqueiro amigo às vésperas de uma mudança no câmbio; Lara Resende renunciou ao comando do BNDES em 1998, na esteira de conversas grampeadas sobre a privatização da Telebras.
EDMAR BACHA
Outro egresso do Cruzado, estudioso da inflação, foi um dos principais professores da PUC-RJ, onde se debatiam estratégias de estabilização que fugiam do receituário heterodoxo.
Até a participação nos planos, era mais conhecido por ter cunhado o termo Belíndia, misto de Bélgica e Índia, para descrever a desigualdade social brasileira no regime militar.
Ativo pelo PSDB na época, foi o encarregado de formular o ajuste orçamentário que precedeu o real e ajudar nas negociações com o Congresso.
PEDRO MALAN
Servidor público, representou o Brasil em organismos internacionais e esteve à frente da renegociação da dívida externa brasileira no início dos anos 1990.
Ingressou na equipe de FHC ao assumir o Banco Central em 1993, depois de mais uma demissão abrupta promovida por Itamar.
A altivez na defesa do plano e o cuidado nas declarações o credenciaram a comandar o Ministério da Fazenda nos dois governos tucanos, uma marca até então impensável desde a redemocratização do país.
GUSTAVO FRANCO
Outro oriundo da PUC-RJ, é usualmente apontado como o mais prático entre os teóricos do real. Encarregou-se de dar forma jurídica às medidas do plano.
No governo FHC, foi diretor e depois presidente do BC, tornando-se o defensor mais extremado da chamada âncora cambial –a estratégia de manter o real sobrevalorizado ante o dólar para conter a inflação.
Deixou o governo em 1999, quando a âncora se mostrava inviável e foi substituída pelo câmbio flutuante e o regime de metas de inflação.